sexta-feira, 28 de março de 2008

Coisas antigas de Clarice Lispector

que lindas são as coisas antigas que se tornaram opacas e amarelecidas porque sobre elas passou a vida, porque crescemos e vivemos tocando-as, fixando na retina as suas formas, fazendo as participar dos nossos segredos, da primeira carta de amor, do primeiro beijo, dos sonhos de felicidade. Foram sonhos que nos fizeram cerrar os olhos para abri-los depois em frente à velha cômoda, à mesa antiquada ou à poltrona desbotada que, durante várias décadas, nos farão recordar a esperança perdida ou realizada, a alegria e o sofrimento nascidos junto àqueles velhos móveis e objetos. nada há, por mais belo, elegante ou moderno, que nos dê esta sensação de mútua e muda compreensão, de solidariedade mesmo, que os móveis e objetos antigos sabem nos transmitir. Que tremenda traição cometemos quando substitímos alguma dessas coisas por outra nova e luzidia, que levará ainda vários anos até adquirir a alma que lhe trasmitiremos.
Retirado do livro Correio Feminino de Clarice Lispector. Editora Rocco: Rio de Janeiro, 2006...

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